Wednesday, February 05, 2003

Vinte Poemas de Amor e Uma Canção Desesperada

Pablo Neruda " Vinte poemas de amor e uma canção desesperada "; [extracto]

(em homenagem ao programa Íntima Fracção)


Eu sou o desesperado, a palavra sem ecos, aquele que perdeu tudo, e teve um dia tudo.

Última amarra, range em ti a minha ansiedade última, na minha terra deserta és a última rosa.

Silenciosa.

É esta a solidão de que estás ausente. Chove. O vento do mar caça errantes gaivotas.

A água anda descalça pelas ruas molhadas. Daquela árvore se queixam, como doentes, as folhas.

Tu revives no tempo, fina e silenciosa.

Silenciosa.

Pensando, enredando sombras nesta profunda solidão.

Também tu andas longe, mais longe que ninguém.

Pensando, soltando pássaros, desvanecendo imagens, enterrando lâmpadas.

Entre os lábios e a voz, algo vai já morrendo.

Algo com asas de pássaro, algo de angústia e de esquecimento.

Da mesma forma que as redes não retêm a água.